O impressionante estudo “Establishment of wild-type song culture in the zebra finch” (encontrado na revista Nature vol. 458 pág. 564, 2009), frequentou as páginas de grandes jornais brasileiros há pouco mais de uma década, mas talvez não tenha recebido a devida atenção pela sua importância.
Ele trata de um tema bastante controverso, a possibilidade da “bagagem genético cultural” na natureza. Ou seja, a de que características culturais de uma espécie possam de alguma maneira ser transmitidas para as futuras gerações.
A pesquisa foi realizada com o pássaro australiano zebra finch (Taeniopygia guttata), conhecido popularmente no Brasil como Mandarin, e trata, resumidamente, da capacidade de novas gerações (a partir da quarta) de pássaros isolados recriarem sons semelhantes ao canto dos pássaros encontrado na natureza.
O estudo verificou o “aprendizado” transmitido geneticamente pelos avós e pais das ninhadas em gerações sucessivas, já que os pássaros são capazes de emitir sons, mas a forma do canto é aprendida em cada colônia através de outros pássaros, assim como a cada linguagem humana é aprendia em seu contexto.
O fato dos pássaros criados em isolamento, com o tempo, emitirem sons semelhantes aos dos criados na natureza, significa que houve uma retomada do padrão antigo de canto, independente da forma como se deu o aprendizado, já que os pássaros estavam isolados. E como isto se deu?
O estudo aponta para a possibilidade de assimilação genética através das gerações.
Seres humanos não são pássaros e lógico que se evita aqui o determinismo evolutivo, mas sim que talvez e somente talvez, neste campo ainda tão desconhecido da humanidade, a genética, possamos encontrar alguns “avisos” para nosso comportamento social.
A notícia mais importante desta segunda feira, 11, é o crescimento da Extrema Direita em Portugal, nas eleições daquele país. Os sentimentos estimulados pelo neofascismo apelam para o que existe de pior em termos de comportamento ético da humanidade: a xenofobia, o racismo, o preconceito, num contexto no qual se interdita o diálogo democrático e político em nome da defesa contra supostos “inimigos externos”.
E este método político, é inegável, tem funcionado eleitoralmente em diversos países. É em nome deste apelo que oportunistas se dão bem, utilizando-se do “medo” como arma política.
E se estas experiências de “proteção de grupo” contra o meio externo, comum na história da humanidade, deixou-se registrada, hipótese, em nosso código genético? E se o estimulo à estas reações primitivas façam muitos agirem inconscientemente, através de traços genéticos ocultos, de forma não racional?
E se povos que passaram por condicionantes geracionais de culturas ditatoriais guardem de alguma forma isto em seus genes, bastando para que sejam acionados de estímulos coletivos? São perguntas que ainda não podemos responder, mas sabemos que os efeitos nocivos do neofascismo como forma de cultura levam gerações para ser superados.
É importante que as forças progressistas permitam se deixar “imprimir” em nossa identidade – para nosso filhos e netos – a “cultura” da resistência ao neofascismo, aos impulsos primitivos que tentam nos distinguir de outros seres humanos.
A cultura da paz, da compressão do outro, a “civilizatória”, enfim, as quais levamos séculos para desenvolver, agora estão ameaçadas por forças primitivas que levam à violência, ao ódio ao outro, à discriminação.
O que sabemos é que o neofascismo é uma forma de “doença”, independentemente de nossa capacidade de assimilação através da bagagem cultural ou não.
O desenvolvimento da ciência com seus resultados, no entanto, nos deixam mais um alerta.
*Marcos H. Guimarães, jornalista, escritor, membro do Coletivo de Cultura Estrela da Encruzilhada, do deputado estadual Dr. Antenor.
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